quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Piano

O som melancólico do piano não encontrou mais os meus ouvidos.
Perdido trocou, sem querer, as suas notas e exprimiu outra melodia.
Poderia?
Chamou a atenção de minhas memórias auditivas, perdidas, supostamente esquecidas.
Eu já sabia, não se controla as lembranças de uma música vivida.
E o piano e eu voltamos a sorrir e cantar poesias.

Eu sei...

Eu sei que talvez nunca consiga fazer você enxergar através dos meus olhos... não é correto querer te empurrar aqui pra dentro, encaixar a força assim...
Eu sei que tento abraçar o mundo, que gosto do muito, do absurdo, do profundo... não é que eu tenha pressa... é que isso já me foi natural... é fruto.
Eu sei que penso demais em tudo... o “por que” é minha palavra favorita.
Mas eu sei o que não quero e o que me faz bem. Penso só pra tentar me entender também.
Não é só você... faz muito tempo que tento me desvendar além.
Enfim... não é correto querer te moldar aqui dentro.
Mas eu sou teimosa mesmo.
E tento...

Realidade montada

Aqui estou... tão receptiva, disposta, oferecida até... e só.
Que realidade permiti pra mim, meu Deus!
Usei cada novo detalhe para me cercar, me proteger...
Só agora me dei conta de que éramos nós, o tempo todo, meu pior carrasco...
não me permiti ser...
fugi de mim como se pudesse...
Essa caixa em que me enfiei é parte você e por isso não a odeio...
mas é que eu não tenho forma e isso tudo aqui é tão quadrado!
E eu sou tão liquida!
Se ao menos você conseguisse me segurar!
Essas palavras já são minhas gotas derramadas pela borda da nossa realidade montada...
Me engole senão evaporo!
Me bebe pra não perder esse gole!
Me chupa pra melhor sentir o gosto. O meu gosto!
Me ondula! Me agita! Me exagera! Me aproveita!
Ainda estou aqui... tão receptiva, disposta, oferecida até...

A morte do Superman

Pra conseguir o que se quer
Só sendo mesmo um Superman
Lutando até o fim
Encarando o que vier

Vestindo a camisa
Com o S estampado no peito
De fora e de dentro
Onde carrega o seu segredo

Mas depois de tantas lutas
As mais valiosas aventuras
Quebrou as suas juras
E manchou sua alma pura

Deixou de ser super
Abandonou a sua capa
Se escondeu de forma dura
Regeitou a graça dada

Se infiltrou na multidão
Como um pecador qualquer
Disfarça sua solidão
Com qualquer outra mulher

Aprendeu a mentir
Enganar e iludir
Acha o errado engraçado
E normal ter que fingir

Perdeu todo o seu brilho
Deixou de ser especial
Rasgou o S do peito
Se tornou mais um mortal.

Você

Essa incapacidade de escrever pra você, de exteriorizar o que sinto por meio das palavras – estas que me são tão intimas e companheiras fieis das piores noites e dos meus melhores dias, parecem me abandonar quando me ponho diante de um lápis e papel pensando em ti.
Então me restam apenas os sentimentos. Serão estes tão complexos que não existam palavras suficientes ou profundas o bastante para traduzi-los? Ou serão tão perfeitos e auto-suficientes que se explicam por si mesmos, sem que arte alguma possa alcança-los?
Nunca me ocorreu essa falta de expressão. Talvez você cause em mim algo tão novo, incontrolável e inalcançável, pelo menos à minha frágil razão, que extrapole os meus próprios limites.
Deve ser exatamente isso que me liga a você, que me atrai como um imã poderosíssimo e me causa essa vulnerabilidade inconsciente, da qual não pretendo me desprender e, se caso for, jamais tentar entender para não correr o risco de nos tornar comum.

Falta

Eu olhava ao redor e sentia falta...
As folhas nas arvores balançando, empurradas pelo vento
Vento com outro perfume...
Meu estomago se contraía sempre que percebia isso.
Era aterrador pensar no futuro, por isso evitava.
Mesmo possuindo quase tudo para ser feliz não o era.
Exatamente por causa do quase.
Ah, e como eu o odiava.
Sentia falta pulsante do exagero em minha vida
E por isso desesperava em minha alma todos os dias.

Eu olhava ao redor e sentia falta.
O sol tocava minha pele e meus olhos ardiam.
Não enxergava mais o azul.
O céu se tornara um grande sol pra mim.
Nem ao menos nuvens,
Sequer o nublado, aquele azul acinzentado...

Eu olhava ao redor e sentia falta.
A musica ainda vivia em mim
Mas não havia mais como exibi-la.
Canção sem segunda voz é incompleta
E as cordas partidas não mexiam mais.
A presença perturbadora e odiosa do quase
Me davam o tal desespero.
Mas meu espírito se tornara covarde.
Faltou-lhe coragem para se libertar,
As pessoas não entenderiam.
Acomodou-se à matéria.
Continuo a olhar tudo ao redor
E sentir essa falta.

Entrelinhar

Hoje eu não quero refletir sobre coisas difíceis, profundas, complexas...
Hoje eu quero “entrelinhar”...
Quero ser despercebida aos insensíveis, quero desenhar com palavras um sorriso enigmático... quero ser a parábola mal interpretada... as palavras mágicas perdidas num livro antigo...
Hoje eu serei parte você... esse arrepio percorrendo suas costas até beijar sua nuca... serei seu estomago dando vida a borboletas... a música que não sai da sua cabeça...
Hoje não me interessa o significado da vida, as respostas exatas, as soluções de emergência.
Hoje eu só quero “entrelinhar”...
Quero ser o paraíso que você toca quando goza... quero ser a lenda mumificada... A outra face da lua... o milagre no final da estrada...

Ana armada

Ana aprendeu a odiar armaduras
A vida inteira ela tinha vestido a sua
Tão áspera, tão pesada, e dura

Era ali dentro que ela se escondia, guardava todos os seus segredos
Só ali que ela vivia e reprimia os seus desejos
Rasgava suas páginas, mascarava os seus medos

A fazia se sentir protegida
Do mundo, da dor, da vida.
Quanta coisa deixou passar por não saber como sentia

Ana aprendeu a odiar armaduras...
Tudo mudou
Depois da mais poderosa das lutas

Ondas sonoras gloriosas vieram guerrear
Ela preparou seu escudo e sua espada enferrujada
Que ainda não tinha aprendido a manusear

Ondas sonoras vitoriosas começavam a quebrar
Pedaços e cacos de armadura
Ana foi se mostrando devagar

Ondas sonoras calorosas envolveram seu coração
E nada foi tão forte e diferente
Do que aquela sensação

Pela primeira vez em sua vida
Ana era livre
Uma verdadeira guerreira destemida

Ana aprendeu a odiar armaduras
Lutando agora de peito limpo
Corajosa, intensa e pura.